Depois do choque dos atentados
terroristas contra as satirazinhas do jornal francês, de cuja condenação poucos
se excluíram, o mundo começou, pouco a pouco, a regressar à normalidade. Sem
grande espanto, boa parte dos Carlinhos que, a quente, repudiaram sem rodeios o
acontecimento, passaram a justificar a infâmia através da insensatez ou das
injúrias a que os desenhadores amiúde se entregavam. Mesmo que não tenham
desculpado os assassinos, desculparam-lhes certamente a irritação. Na cabeça de
quem pensa assim - caríssimo leitor – a acção de espingardar contra os outros é
inaceitável, mas o estado de espírito que antecipa e leva a pegar em espingardas
é compreensível e justo. A fronteira entre o perdoável e o imperdoável, para a
maioria dos homenzinhos e das mulherzinhas que sobre isto tiveram a
oportunidade de dizer alguma coisa, está naquilo que distingue o fazer do
pensar fazê-lo; o que não admite perdão, portanto, não são os crimes
propriamente ditos, mas a incapacidade de açaimar o ódio despertado pelas
provocações alheias.
25/02/2015
13/02/2015
06/02/2015
Ipsis Verbis (14)
Tenho uma religião, a minha religião, e até tenho
mais que todos eles com as suas momices e imposturas! Pelo contrário, creio em
Deus! Creio no ser supremo, num Criador, seja ele quem for, pouco importa, que
nos pôs neste mundo para cumprir os nossos deveres de cidadãos e chefes de
família; mas não tenho necessidade de ir a uma igreja beijar salvas de prata e
engordar à minha custa uma cambada de farsantes que vivem melhor do que nós!
Posso honrar a Deus da mesma maneira num bosque, num campo, ou até contemplando
a abóbada etérea, como os antigos. O meu Deus é o mesmo de Sócrates, de
Franklin, de Voltaire e de Béranger! Eu sou pela profissão de fé do vigário
saboiano e pelos princípios imortais de 89! Por isso não admito que Deus seja
assim um sujeito que anda a passear no seu jardim de bengala na mão, instale os
seus amigos no ventre das baleias, morra soltando um grito e ressuscite ao cabo
de três dias: coisas absurdas por si mesmas e completamente opostas, além
disso, a todas as leis da Física; diga-se de passagem que tudo isso prova que
os padres estagnaram sempre numa torpe ignorância, onde se esforçam por atolar
também as populações.
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